Governo quer apagar fogos e atira com milhões de euros

A reforma da Proteção Civil, que pretende aproximar a prevenção do combate aos incêndios e reforçar o profissionalismo, deverá passar pela entrada do Estado na rede SIRESP e por vários apoios dirigidos às populações e às zonas mais afetadas.

Medidas anunciadas este sábado pelo Governo, que se sentou à mesa para discutir, durante 11 horas, a reforma nos sistemas de prevenção e combate aos incêndios e adotar medidas de emergência de apoio às vítimas, depois dos incêndios de Pedrógão Grande (junho) e da zona Centro (15 e 16 de outubro), que provocaram a morte a mais de 100 pessoas e deixaram um rasto de destruição de casas, empresas e património florestal.

Eis as principais medidas anunciadas este sábado:

“Os valores que referenciámos, entre as várias fontes de financiamento – parte fundos comunitários, parte Orçamento do Estado – andarão na ordem dos 400 milhões de euros genericamente”, anunciou o ministro do Planeamento e Infraestruturas, Pedro Marques.

“Não chegarão, mas estarão perto disso. Estamos a falar de linha de crédito, de 100 milhões de euros de apoios a fundo perdido ao investimento, dos 100 milhões de investimento coim 50 milhões de euros de financiamento da parte dos fundos comunitários, também do 30 milhões de euros do Orçamento do Estado para a reconstrução de habitações, também de cerca de 30 milhões de euros do lado da agricultura e investimentos de 35 milhões de euros na agricultura e ainda de 13 milhões do lado do emprego e Segurança Social – portanto valores entre os 300 e 400 milhões de euros mobilizados”, acrescentou.

Papel reforçado das Forças Armadas

As Forças Armadas vão passar a ter um papel reforçado no apoio de emergência, ao nível do patrulhamento, tanto na prevenção como no combate aos incêndios, ficando a gestão e a operação dos meios sob alçada da Força Aérea.

O primeiro-ministro disse que "um papel alargado" das Forças Armadas relativamente "ao apoio militar de emergência ao nível do patrulhamento, nas ações de rescaldo, na parte logística, no auxílio junto das populações e, ainda, no que respeita às capacidades no apoio ao processo de decisão".

António Costa frisou depois que a Força Aérea "ficará com a gestão e operação dos meios aéreos de combate aos incêndios florestais", sendo que esta gestão e operação, por parte da Força Aérea, abrangerão os meios próprios que este ramo das Forças Armadas venha a dispor, mas, igualmente, "a gestão dos meios próprios do Estado e a gestão dos contratos de meios aéreos de combate aos incêndios".

Profissionalização do modelo de combate aos fogos

O Governo pretende retomar a expansão das companhias dos GIPS (Grupo de Intervenção Proteção e Socorro) da GNR, segundo o primeiro-ministro, que considerou que, "ao longo de dez anos", estas companhias GIPS "demonstraram ser uma unidade altamente profissionalizada e capacitada, cujo desenvolvimento contribuirá certamente para o reforço da segurança coletiva".

Além disso, foi também decidido que a Autoridade Nacional de Proteção Civil (ANPC) vai ser "definitivamente institucionalizada, com um quadro de profissionais próprios, com carreira própria, com dirigentes designados por concurso".

A ANPC, tutelada pelo Ministério da Administração Interna, e o Instituto de Conservação da Natureza e das Florestas (ICNF), estrutura do Ministério da Agricultura, vão ter um reforço de meios: foi aprovada a criação de uma linha de apoio à investigação na Faculdade de Ciências e Tecnologia; o reforço da componente da formação nos Institutos Politécnicos e a incorporação, em toda a cadeia de decisão, de novos saberes em matérias de gestão de fogos, previsão meteorológica e conhecimento científico aplicado.

Em relação aos bombeiros voluntários, o Governo quer criar em cada associação humanitária de bombeiros voluntários das zonas de maior risco de incêndio, equipas profissionais que sejam com bombeiros formados na escola de bombeiros, que será integrada no sistema formal de ensino, enquanto escola profissional".

Criação de unidade de missão

O Governo pretende criar uma unidade de missão, que ficará sob dependência do primeiro-ministro, para concretizar a reforma dos sistemas de prevenção e combate a incêndios, designadamente reforçando a capacidade da ANPC.

O objetivo desta unidade é "conduzir o processo de transformação do atual modelo de prevenção e combate, após os incêndios deste verão, para o modelo futuro" e o seu mandato inicia-se já na segunda-feira e termina em dezembro do próximo ano.

"Ao longo deste ano serão feitos os trabalhos que irão permitir criar condições para que a ANPC tenha a capacidade suficiente, mas também começar com o programa de reforço do Instituto de Conservação da Natureza e das Florestas (ICNF)", acrescentou António Costa.

Indemnizações a familiares das vítimas


A comissão para pagamento de indemnizações aos familiares das vítimas dos incêndios terá 30 dias para fixar os critérios, cabendo depois à Provedoria de Justiça estabelecer o valor das compensações.

Esta resolução foi anunciada pela ministra da Justiça, Francisca Van Dunem, que acrescentou que o mecanismo extrajudicial de compensação relativo às vítimas dos incêndios de Pedrógão Grande (junho) e do passado domingo e segunda-feira terá uma adesão voluntária por parte dos familiares e herdeiros das vítimas.

Reconstrução de casas e empresas

O Governo vai, em parceira com as autarquias atingidas pelos incêndios, disponibilizar 30 milhões de euros para a reconstrução de primeiras habitações destruídas e mais 100 milhões de euros para a reparação de empresas.

O anúncio coube também ao ministro do Planeamento e das Infraestruturas, Pedro Marques, salvaguardando, no entanto, que em ambos os casos, em primeira instância serão acionados os seguros, entrando o Estado sempre que este mecanismo não seja possível.

O governante avançou uma estimativa provisória, calculando que possam estar em causa 500 casas de primeira habitação destruídas total ou parcialmente e cerca de 300 empresas.

Pagamento de salários e apoio ao emprego

O Governo pretende apoiar temporariamente, num mínimo de três meses, o pagamento de salários de trabalhadores com emprego em risco em consequência dos incêndios de junho em Pedrógão Grande e de meados de outubro em vários pontos do país, uma medida que o ministro do Trabalho e da Segurança Social disse que poderá custar 13 milhões de euros.

Além disso, ficou prometido que serão reforçados os apoios sociais às pessoas e às instituições das áreas atingidas pelos incêndios.

Sublinhando que podem estar em risco cinco mil postos de trabalho devido à destruição provocada pelos incêndios, Vieira da Silva disse que serão tomadas "medidas para a redução ou até mesmo para isenção das contribuições à Segurança Social e para abrir a possibilidade de as empresas poderem diferir o pagamento das suas contribuições à Segurança Social".

Apoios ao setor agrícola e florestal

O setor agrícola e florestal contará com uma verba de até 35 milhões de euros para apoiar a alimentação dos animais e o depósito e a comercialização da madeira ardida.

De acordo com o ministro da Agricultura, Capoulas Santos, vão ser alocados 15 milhões de euros para "acudir aos problemas mais graves" de erosão dos solos e contaminação das águas.

Na área florestal vão ser criadas duas linhas de crédito, uma de cinco milhões de euros para a instalação de parques para depósito da madeira ardida, e outra de três milhões de euros para a comercialização da madeira ardida a preços considerados razoáveis.

Posição acionista do Estado no SIRESP

O Governo quer que o Estado tome uma posição acionista no SIRESP (Rede de Emergência e Segurança), podendo chegar ao seu controlo, e pretende acionar programas para enterramento de cabos aéreos e limpeza de vias.

O ministro do Planeamento e das Infraestruturas afirmou que para já, o Estado converterá em ações créditos da Datacomp e da Galilei, e admitiu que a prazo o Estado poderá ter mesmo uma posição de controlo acionista do SIRESP.

Novos investimentos no SIRESP

O Governo anunciou que, com o papel acrescido ao nível da gestão desta rede de comunicações de emergência SIRESP, promoverá um conjunto de novos investimentos na ordem dos oito milhões de euros.

O anúncio coube a Pedro Marques, que disse que o executivo pretende "adquirir mais quatro estações móveis com ligação satélite para reforçar as comunicações de emergência quando há incêndios, ou quando se verificam interrupções de rede", bem como contratar "um sistema adicional de redundância com ligação à rede de satélite".

Outra medida ao nível das comunicações passará por favorecer o enterramento dos cabos aéreos, de telecomunicações e energia, que ardem facilmente nos incêndios.

Em causa está a isenção, por três anos, do pagamento da taxa de utilização de condutas para as empresas que procederam ao enterramento dos cabos, e nos cinco anos seguintes, uma redução de 30% no valor que pagam para a manutenção das condutas de cabos por fibra ótica.

As empresas que ainda não tenham rede em territórios do interior e que reforcem as ligações por cabo de fibra ótica, "poderão beneficiar ao longo de oito anos de uma redução de 30% no custo em relação à oferta de referência" praticada pelas Infraestruturas de Portugal.

Pedro Marques disse também que a Infraestruturas de Portugal já chegou a acordo com a Altice para o enterramento em 2018 e 2019 dos primeiros 1000 quilómetros em condutas da rede rodoviária.

Relativamente ao programa de limpeza de áreas nas faixas das rodovias (cerca de 16 mil quilómetros) e das ferrovias, será feita "uma limpeza integral até aos dez metros, reforçando-se assim a segurança no contexto dos territórios com maior risco de incêndio".

O governante estimou que este programa de limpeza terá no orçamento das Infraestruturas de Portugal uma estimativa de 28 milhões de euros no próximo ano.

Reforço da resiliência do território

O ministro do Ambiente anunciou um investimento de cerca de 20 milhões de euros no domínio da resiliência do território, nomeadamente a contratação de 100 equipas de sapadores, 50 vigilantes da natureza e um projeto de voluntariado jovem.

João Matos Fernandes disse o executivo vai replicar o projeto-piloto da Peneda-Gerês (cuja área ardida foi 60% inferior ao ano passado) a outros parques florestais nacionais, comprar de equipamentos e contratar 100 equipas de sapadores nos próximos dois anos, o que corresponde a 500 pessoas (atualmente existem 292 equipas de sapadores).

Também a prevenção e o combate aos incêndios florestais vão ser reforçados com mais 50 vigilantes da natureza, dos quais 20 entram já ao trabalho no próximo dia 04 de novembro.

No âmbito da prevenção estrutural das matas nacionais, o Governo vai alocar três milhões de euros para a rede primária de defesa contra incêndios, investimento que poderá ser "multiplicado" através de uma candidatura ao Programa Operacional Sustentabilidade e Eficiência no Uso de Recursos (POSEUR).

O reforço da resiliência do território nacional passará também pela implementação de "um projeto de voluntariado jovem para natureza e para as florestas", que no próximo ano deverá envolver 10 mil jovens, entre os 18 e os 30 anos, na sensibilização da comunidade para as questões da proteção da natureza.

Aposta nas biorrefinarias e centrais de biomassa

A implementação de biorrefinarias e a continuação do desenvolvimento de centrais de biomassa por todo o país estão entre as medidas apresentadas hoje para valorizar a recolha de resíduos florestais.

O ministro da Economia, Caldeira Cabral, afirmou que o plano nacional para a implementação de biorrefinarias vai depender "essencialmente de fundos estruturais", considerando que ainda não é possível prever qual a verba necessária, e que o seu desenvolvimento será sujeito a concurso.

Também se prevê a manutenção da aposta no desenvolvimento das centrais de biomassa, que "poderão ter um investimento de cerca de 35 milhões de euros anuais, ao longo de vários anos".

Comentários